ALBERT
No Swiss Patent Office, Berna, o diretor Hans Brunner deu duas batidinhas na porta do seu mais abnegado funcionário antes de entrar sem cerimônia:
– Vamos almoçar, Albert?
– Obrigado, Hans. Mileva me fez um sanduíche de presunto com queijo, que já devorei.
– Muito trabalho?
– Se você me desse... – riu. – Brincadeira. O movimento anda fraco, o pessoal não está muito inventivo. Um ou outro pedido maluco de dispositivo elétrico ou eletromecânico. Promova-me a perito técnico de segunda classe e quem sabe a coisa melhore!
– É a época, meu amigo!
– É, a culpa é sempre da época. E aí, no meu tempo livre, dedico-me ao meu passatempo favorito: física teórica.
– E sobre o que anda teorizando?
Albert pegou seu copo d´água cheio e salpicou açúcar sobre ele, mostrando-o para Brunner.
– Estou finalizando um artigo que explica o movimento aleatório e desordenado de partículas suspensas em um fluido, e que pode confirmar a existência de átomos e moléculas.
– Ufa, achei que estivesse simplesmente me
oferecendo água com açúcar para me acalmar do marasmo do escritório...
– Segundo minha proposta, as partículas em suspensão são constantemente bombardeadas pelas moléculas do fluido, que se movem de maneira desordenada devido ao calor. Esses choques aleatórios fazem com que as partículas se movam de forma errática e imprevisível.
– Hum...
– E então estou desenvolvendo uma equação matemática que tenta explicar esse movimento, que estou chamando de equação de difusão. Ela relaciona a taxa de difusão da partícula com a temperatura e outras propriedades do fluido.
– E por que isso comprovaria a existência de átomos e moléculas?
– Elementar, meu caro: porque o movimento errático das particulas só poderia ser explicado se elas estivessem sendo incessantemente bombardeadas por moléculas menores.
– Claro! Por que não pensei nisso antes, como seu tolo. Mais alguma ideia inovadora?
– Sim. Até pelo meu excesso de tempo livre aqui tenho pensado muito no assunto.
– Tem pensado sobre qual a próxima patente maluca que pode cair em suas mãos?
– Pode ser! – Albert dobrou-se a gargalhar. – O assunto a que me referi é o “tempo” mesmo. O tempo e o espaço. Tenho ponderado sobre como as leis da física se aplicam em diferentes referenciais de movimento. Veja, o que me intriga é a ideia de que a velocidade da luz é constante em todos os referenciais. Isso não faz muito sentido para mim, deve haver algo mais acontecendo.
– Interessante, Albert...desenvolva um pouco melhor sobre isso a um velho burocrata e curioso na área.
– Você não está faminto?
– Eu vou sobreviver.
– Está certo. Bem, nas minhas ponderações, estou a questionar a suposição de que o tempo e o espaço são absolutos, mas buscando uma maneira de reconciliar essas observações com as leis da física em voga. Trocando em miúdos: acredito que o espaço e o tempo estão entrelaçados, e que a velocidade da luz é a mesma para todos os observadores, independentemente de seu movimento relativo. Mas ainda não tenho uma estrutura matemática para apoiar essa ideia. Estou tentando.
– Meu caro Albert, permita-me fazer uma provocação. Você já considerou a possibilidade de que o tempo e o espaço não sejam absolutos, mas relativos?
– Hum...e que a geometria dessas dimensões possa mudar dependendo do observador?
– Algo assim.
Albert inclinou a cabeça olhando para a luz do teto, pensativo.
– Relatividade do espaço e do tempo...está aí! Muito bem, Hans, isso poderia funcionar! Uma abordagem em que as leis da física sejam as mesmas para todos os observadores, independentemente de sua velocidade relativa. Mas como a gente pode expressar isso matematicamente?
– Aí, meu caro, já escapa às minhas habilidades! Vamos ver. Que tal, então, explorar a ideia de que o tempo e o espaço estão unidos em uma única entidade, e que a geometria dessa entidade possa ser descrita por uma equação?
– Sim, uma equação! Seria como encontrar uma "geometria curva" que descreva como a matéria e a energia influenciam ao redor dessa entidade de que você fala, que podemos chamar de...claro, “espaço-tempo”!
– Espaço-tempo, geometria curva...brilhante, Albert, parabéns! Ponha a ideia imediatamente no papel, antes que esqueça.
– Eu é que agradeço, Hans! Essa conversa com você
foi deveras proveitosa! Mas não termina aqui: vamos lá, eu lhe faço companhia
no seu almoço...
Lui França, junho de 2023.
Comentários
Postar um comentário