O REINO DA FELICIDADE

 


Era uma vez o Reino da Felicidade

Onde tristeza não se conhecia

De velho ou moço, qualquer idade

Iniquidade não se via

Jamais se passava maldade

À sombra da noite, à luz do dia

E assim o reino prosperava

Sem nenhum óbice ou trava

 

Um dia o monarca Régis Quinto

Do trono interpelou príncipe Arthur:

“Meu filho, sabereis o que sinto,

Digo a vós com nulo glamour:

Ignorância não mais consinto,

Carregai vossa excalibur,

Conhecei do mundo a tristeza,

Regressai a dar conta à realeza.”

 

À mente do príncipe adveio

À angústia do rei melhor saída:

“Meu pai, digo a vós, sem rodeio,

Essa busca de toda uma vida

Prescindível deve ser, eu creio:

A mil léguas do reino há um druida,

Paracelso, o equino, tão multíscio,

Saberá revogar vosso suplício.”

 

Na alvorada da primavera régia

Partiu o príncipe ao destino

Mas mesmo sua condição egrégia

Não lhe afugentava o desatino

De não levar consigo estratégia

Ante a algum mal repentino

A passos firmes ao sábio mago

Além das montanhas e do fago

 

Em paralelo ao caminho do infante

Recôndita o seguia uma bruxa hiena

Aproximando-se do fidalgo errante

Que não lhe era digno de pena:

“Surpreendê-lo-ei mais adiante

Como um leporídeo ou uma falena.”

Tiraria proveito do andarilho

Faria que desviasse do seu trilho

 

Dali a pouco viu a alteza um velho

Ensimesmado a colher morango

“Escuse por meter o bedelho,

A flagrar a vós como um samango,

Mas busco por um breve conselho,

Pelo qual vos ofereço mango:

Se essa vereda a Paracelso leva,

E se não, a exata descreva.”

 

O velho então, no rosto um sorriso

Ao príncipe testificou sua ideia:

“A tão nobreza não farei improviso,

Tergiversar ou darei cara feia,

Digo a vós, firme e conciso,

Por esta via a três léguas e meia,

Trás dos montes vive o sábio cavalo,

Na choupana sobre o grande resvalo.”

 

Surpreendido com tão feliz notícia

De saber que tão próximo o mágico

Debandou a correr sem perícia

O infante ao desígnio, enérgico

No caminho uma pomba factícia

Ultrapassou, rumo ao mitológico,

O príncipe que, em seu devaneio,

Do fato permaneceu alheio

 

Ao atingir o lúgubre mocambo

Viu o infante um equino a mascar feno

Mas porque o tal lhe afigurou mulambo

Não o mesurou ou lhe deu aceno

“Escuse o meu esculhambo,

Aconchegue-se em meu terreno,

Honra a que devo de tão nobre visita

A adentrar em tão pobre casita?”

 

“Perdoe nosso intrometimento,

Sapiente mentor Paracelso,

Necessito, porém, de provimento

E de vosso conhecimento excelso,

Sou Arthur, a vós me apresento,

Para ouvir de tão meritório senso,

A meu pai, o rei, uma resposta,

A adversidade a mim exposta.”

 

Pôs-se o druida a escutar, zeloso,

Do príncipe a amargura do rei:

“Venho de um reino onde alegria e gozo

Imperam como de lei,

Mas meu pai, deveras encabuloso

Com o fato, quer saber a sua grei

O que ainda a todos é um mistério:

Da tristeza dai vosso magistério.”

 

Repousou o mago em pilha de palha

E pregou, olhos fixos no horizonte:

“Remédio para tal agrura que valha

Ao príncipe digo, não há de monte

É apenas uma, tão canalha,

A todo ser há que amedronte:

Deve o rei perecer para sempre

E tristeza sob teu reino se cumpre.”

 

O príncipe, tomado pelo aperto, 

Pensou consigo em tal expediente, 

E crente que aquilo era um desconcerto, 

Respondeu ao druida, onisciente: 

Meu pai é justo, sábio e não subverto: 

Não mereceria tal fim incoerente. 

Buscarei outro jeito, com dedicação, 

De afastar do meu reino o mal e a aflição.

 

O druida então, com olhar seguro

Viu no jovem uma chama, uma luz,

Um desejo de mudar o que lhe era duro, 

De arrancar-lhe todo o mal, todo pus:

“Se o amor lhe é tão puro, 

Não será a tristeza que lhe reduz. 

Busca a essência do que faz sorrir, 

E teu reino jamais verá o porvir.

 

Arthur retornou de volta ao castelo

Com a solução na ponta da língua 

Reunindo o povo em entardecer belo 

Disse: “Nada de tristeza ou míngua:

O amor é chave, faço-lhes um apelo, 

Para que tristeza sobre nós não deságua, 

Nos pequenos gestos, no bem comum, 

Reside segredo para viver em jejum.

 

O rei, ao ouvir a lição do estimado filho, 

Sentiu seu coração aliviado e sóbrio

Abraçou Arthur com nenhum empecilho

E dirigiu-se ao povo, sem opróbrio:

“Este reino deve seguir o trilho

Da alegria, do júbilo e do equilíbrio,

Nunca haverá lugar para a tristeza

Em nossa amada Realeza.”

Lui França, 2024


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